Suspensão de Regulações de IA por Iniciativa de Trump Pode Impactar o Setor de Tecnologia no Brasil

Suspensão de Regulações de IA por Iniciativa de Trump Pode Impactar o Setor de Tecnologia no Brasil

O Congresso dos Estados Unidos aprovou um projeto de lei, denominado “One Big Beautiful Bill”, que redefine de maneira significativa as políticas públicas, fiscais e regulatórias em relação à tecnologia. Aprovado por uma margem estreita na Câmara dos Deputados, o projeto cria uma moratória de dez anos sobre legislações estaduais relacionadas à inteligência artificial. Além disso, desmantela regulações existentes e interrompe mais de 60 iniciativas em tramitação que visam mitigar os riscos associados a algoritmos enviesados, proteger dados sensíveis e estabelecer restrições ao uso de IA por parte de empresas e governos.

Essa proposta legislativa não se apresenta isoladamente, pois canaliza investimentos significativos para tecnologias de vigilância nas fronteiras, além de aumentar gastos com segurança, enquanto reduz incentivos a energias renováveis, saúde pública e programas sociais. Também promove a continuidade das vantagens fiscais implementadas durante a administração anterior, como isenções para grandes fortunas e contas de poupança para recém-nascidos, sem tributação sobre dividendos. Essas iniciativas refletem o núcleo do tecno-libertarianismo associado ao trumpismo, defendendo a diminuição do papel do Estado em favor da iniciativa privada, especialmente no que se refere a empresas de tecnologia na região do Vale do Silício.

Especialistas apontam que essa abordagem de governança, embora apresentada com a promessa de inovação e desburocratização, compromete a soberania informacional do país e transfere autorizações historicamente públicas para corporações privadas. A proibição da regulação estatal em relação à IA representa, na prática, uma situação favorável para empresas como OpenAI, Google, Amazon e Meta, permitindo o desenvolvimento e a aplicação de tecnologias sensíveis sem a supervisão de critérios locais de transparência e segurança. Tal circunstância cria uma blindagem institucional que favorece a dominação das big techs em um setor crucial para a governança democrática no século XXI.

As repercussões desse tipo de abordagem legislativa têm potencial impacto global. No Brasil, surgem preocupações sobre a possível adoção desse modelo, impulsionada por parlamentarismos ligados à chamada “bancada do like” e pela Frente Parlamentar Mista da Economia Digital e Inovação, que promove uma agenda voltada para o fortalecimento do setor digital sem restrições regulatórias. Ambos os grupos contam com a influência de think tanks e representantes do setor privado, atuando no Congresso para evitar normas consideradas como obstáculos para o crescimento das plataformas digitais e da economia de dados.

Esse cenário torna-se mais alarmante quando se compara propostas em tramitação no Brasil que refletem uma lógica desregulatória semelhante à do projeto americano. Existem iniciativas que tentam limitar a atuação de estados e municípios na definição de normas sobre proteção de dados, regulação de algoritmos e uso ético de IA. Além disso, discursos políticos estão sendo moldados por uma perspectiva que considera a soberania informacional como um impedimento para o “avanço digital”, obscurecendo, assim, a importância dos direitos humanos e do bem comum.

A adoção acrítica desse modelo de governança digital, inspirado pelas políticas ligadas ao “One Big Beautiful Bill”, pode comprometer a autonomia do Brasil em questões de inteligência artificial, proteção de dados e regulação de plataformas. É necessário fomentar a inovação, mas não sem assegurar garantias de soberania informacional, pois há riscos de o Brasil se tornar um campo de testes para as big techs, com insuficiência de mecanismos institucionais para prevenir abusos, manipulações informacionais e desequilíbrios econômicos e políticos.

A atual dinâmica legislativa nos Estados Unidos, refletindo um resgate político da administração anterior, serve como um alerta para que o Brasil reforce suas instituições reguladoras, proteja as iniciativas estaduais e municipais que visam garantir a transparência e a justiça algorítmica, e resista às pressões políticas que favorecem a captura de políticas públicas em nome de interesses privados globais. Em uma era de guerra híbrida e manipulação informacional em larga escala, proteger a soberania informacional não é apenas uma questão preventiva; é uma necessidade democrática.

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